Neste mundo que nos tocou viver, temos que matar um leão por dia. Somos cobrados e ao mesmo tempo cobramos metas, números, competências, desempenhos. Precisamos ultrapassar a concorrência, vencer desafios e mostrar a todos que somos os melhores. Temos que ser perfeitos, bem sucedidos e deixar bem claro para todos que o fracasso mora ao lado.
Acontece que não somos perfeitos. Ninguém é perfeito, mas não queremos mostrar isto. Escondemos nossos defeitos e não mostramos quem somos de verdade. Temos vergonha que descubram nossas fraquezas. Fomos criados para nos preocupar com o que os demais pensam de nós e para permitir que outros ajudem a definir quem somos.
Por conta disto, todos os dias, antes de sairmos da cama, precisamos vestir nossa máscara de super herói. Atrás dela, ocultamos nossos pontos fracos, disfarçamos nossos medos e ficamos prontos para encarar o cliente, o patrão, o vizinho, o colega, o marido, o pai, o amante, o professor...
No momento em que colocamos o disfarce de heróis, ocultando nossos medos, um fenômeno interessante nos atinge. Não se pode escolher congelar seletivamente uma única emoção. Se paralisarmos o medo ou a vergonha, automaticamente a alegria, o amor ou a felicidade poderão ser embalados no mesmo pacote.
Quando o patrão diz que precisamos trabalhar mais horas, pois não atingimos os objetivos, não gostamos, queremos reclamar, mas com medo de uma demissão, encaramos a nova ordem e aumentamos nossa carga de trabalho. Não mostramos o medo, e depois em casa, não mostramos a alegria. Medo e alegria paralisados.
O marido reclama da esposa, sobrecarregando-a com um monte de novas obrigações. Não querendo estragar o casamento com discussões, ela vai lá e faz o que ele quer. Não mostra a vulnerabilidade e à noite não dá amor. Simples assim! As conseqüências de enterrar emoções vão aparecer, cedo ou tarde. É muito cansativo ser alguém que você não é. Além disto, de tanto usar a máscara, ela pode grudar no rosto e não mais sair. O individuo passa tanto tempo longe de si, que depois se desconhece.
Além de vestirmos a mascara, a colocamos também em nossos filhos. Começamos desde cedo a prepará-los para a competição da vida. Inglês, computação, judô. Queremos torná-los perfeitos, talvez até porque lá em nosso íntimo, reconheçamos nossas deficiências.
Na minha infância sonhava em ser super herói. Cresci, virei adulto e hoje sei que super heróis não conseguem levar uma vida com emoções e afetos. Escondem-se atrás de uma identidade secreta, de uma máscara. Não era o Superman quem amava a Lois Lane; o apaixonado era o desajeitado Clark Kent. Batman, Homem Aranha, qualquer um destes mascarados com rótulo de super-herói não conseguem se relacionar. Super-heróis não podem amar, suas vidas se resumem a salvar vidas em perigo e depois sumirem.
Os tempos são outros, e hoje em dia, o verdadeiro ato de bravura é se mostrar. Não é doloroso nem vergonhoso mostrar suas imperfeições, fragilidades e vulnerabilidades. É isto que nos faz diferentes, é isto que nos torna bonitos, é isto que nos humaniza.
A diferença entre super-herói e ser humano não está na fantasia que se usa. Com esta a gente pode brincar. Talvez a verdadeira diferença esteja na coragem. Não na coragem para lutar contra bandidos e malfeitores. Coragem de gritar por socorro, dar um tempo para se conhecer, descobrir aquilo que somos e nos diferenciar do que não somos. Resumindo, coragem para se assumir.
Nietzsche, o grande filósofo já dizia: “Torna-te quem tu és”. Agora pergunto eu: “Estamos nesta correria toda para agradar a quem? Quem você não quer desapontar, quem deseja orgulhar? Cuidado com suas respostas, pois ao tentar agradar aos outros pode estar se perdendo de você.
Alguns conselhos como esse só me chegaram na maturidade, onde a vida já trilhava longas caminhadas de aprendizagens. Penso que fui muito cobrada sim, em meus papeis existenciais, e que ao olhar para minha trajetória posso afirmar que evolui mais do que eu jamais teria imaginado. Há espaço para tudo e todos nesta existência. Erros e acertos fazem parte da experiência... Agora observo a vida com mais calma e sem pressa. Marilucia O. Gandon
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