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sexta-feira, 17 de novembro de 2023

AMOR OU DELINQUÊNCIA?


Romperam um namoro de quatro anos, cada um dizendo que não agüentava mais, que o término seria uma libertação para ambos e que a culpa não era de nenhum dos dois. Nada de ofensas, cobranças, reclamações ou lágrimas. Educadamente deram-se um último abraço e reciprocamente desejaram-se boa sorte.

Passados dois meses da separação, João resolveu atormentar Maria enviando-lhe uma mensagem, a primeira e única desde o último encontro.

“Sonhei contigo esta noite Maria. Estavas te preparando para o primeiro encontro depois que nos separamos. Era com o primo de tua amiga Juliana, ela jurava que vocês combinavam e insistiu na apresentação. Estavas agoniada, não sabias que roupa usar, andavas de um lado para outro. Eu estava sentado no sofá da sala te observando, mas não conseguias me ver.

sexta-feira, 4 de novembro de 2022

Medo - Genérico ou Original

 

Muita gente tem medo de mim. Não sou mal encarado, bandido, malfeitor, delinquente ou brigão. Nada disso. Sou médico anestesiologista, trabalho em um hospital e incontáveis vezes ao me apresentar aos pacientes, fui recepcionado com frases do tipo chegou o perigoso, tenho medo da anestesia, tenho um conhecido que morreu da anestesia e por ai vai.

É o preço que pagamos por um passado onde a anestesia era realizada de maneira empírica, sem instrumentos apropriados,  conhecimento especializado ou medicamentos seguros e, por conta disso, ocorreram inúmeros acidentes. Naquela época, quando uma pessoa necessitava ser submetida a uma operação, a família profilaticamente rezava e chorava na porta do centro cirúrgico esperando por uma desgraça iminente. Hoje anestesia é um procedimento extremamente seguro, praticamente isenta de riscos.  Os tempos mudaram, porém o medo teima em persistir.

segunda-feira, 17 de agosto de 2020

Quando as portas se abrirem

 Em plena pandemia, você retido contra vontade em casa há mais de cem dias, resolve passar o tempo  arrumando os armários de seu quarto. Bem lá no fundo da última gaveta, encontra uma velha lâmpada metálica, guardada desde os tempos da infância, que nem lembrava mais que existia. Como na história de Aladim, esfrega um pano para limpar a poeira e surpresa: surge o gênio da lâmpada.

Desta vez não lhe pede para fazer três pedidos, oferece de imediato aquilo que talvez você e toda a torcida do Flamengo estejam suplicando há meses: a cura da pandemia e o retorno da liberdade de ir e vir. Só que este é um gênio do século 21, não tão bondoso, e vai lhe cobrar algo em troca. Mas fique tranquilo, você pode escolher o que vai ceder na permuta, ele lhe ofereceu várias opções.

- Você sai da quarentena imediatamente, mas estará envelhecido 10 anos.

- Você sai da quarentena agora mesmo, porém 20 quilos mais gordo.

- Você paga um milhão de dólares e está livre da quarentena.

- Você não terá mais seus amigos, sua família, seu trabalho, sequer seu idioma. Será um imigrante alienígena no momento que sair da quarentena.

- Se você é um crente religioso, deixará de ser. Se não acredita em Deus, passará a ser um religioso fanático.

- Você perderá a capacidade de sonhar, apaixonar e amar no momento que sair da quarentena.

Pronto, pode escolher uma alternativa. Só uma e instantaneamente estará livre. Existe também a opção de não dar ouvidos ao gênio e permanecer na quarentena aguardando a descoberta da vacina.  Precisa de um tempo pra pensar? Não demore muito, agora que o gênio está livre, não ficará lhe esperando eternamente, ele quer aproveitar a liberdade repentina.

Será que o gênio é tão genial assim? Se fosse tão poderoso, não estaria preso dentro de uma lâmpada. O preço que o gênio paga por seus poderes mágicos é a perda da liberdade. Ele sabe bem o que é viver séculos trancafiado dentro de uma lâmpada esperando que alguma alma ingênua e distraída a esfregue para libertá-lo. E por saber o extraordinário valor da liberdade, ele geralmente agradece seu salvador concedendo-lhe três pedidos como pagamento.

A semelhança do gênio, estamos trancados dentro de nossas casas esperando que alguma mente pesquisadora brilhante descubra a tal vacina e nos liberte da quarentena. Estamos preparados para sair? O que vamos oferecer como pagamento ao nosso salvador? Talvez este tempo de cativeiro seja útil para revermos a preciosa liberdade que possuíamos.

Liberdade não significa ir e vir sem responsabilidade. Liberdade é um estado interior, inclui se prender, se agarrar, possuir uma dependência livre e voluntária em alguém ou algo. Carpinejar escreve que liberdade é ter alguém em quem se prender.  No momento em que sentimos segurança na família, amigos, religião, trabalho, amores, valores, seja lá o que for, podemos alçar voos bem mais altos. Se você vestir um paraquedas, pode se jogar de um avião nas alturas com toda segurança. Se amar e for amado, pode desmedidamente se entregar; se tomar vacina pode sair sem medo pra rua.

Liberdade não é um luxo dos bem aventurados nos tempos de bonança, os melhores textos sobre liberdade foram escritos no isolamento do cárcere. Escravos, presidiários, o gênio da lâmpada e agora nós mesmos, estamos provando o amargo sabor da liberdade perdida. O que poderíamos oferecer ao planeta como recompensa quando formos soltos vivos e com toda segurança?  Pense nisso enquanto as portas não abrem.

 

 

 

 

quarta-feira, 15 de abril de 2020

Queremos viver


Querida Anne

Como estão as coisas por ai? Tempos difíceis, não é? Escrevo em formato de carta porque agora, durante a quarentena, tenho tempo de sobra pra conversar, então resolvi voltar aos velhos tempos, aqueles onde éramos felizes e não sabíamos. Só que estou tão acostumado a mandar mensagens por whatsapp que talvez me atrapalhe e cometa alguns erros de português. Queria te contar algumas experiências de meu isolamento social.

Desde criança tinha o sonho de ficar uma semana trancado dentro de uma grande livraria. Preciso ter mais cuidado com meus pensamentos, eles podem se transformar em realidade. Meu pedido foi atendido e veio maior que imaginava. Ganhei um mês trancado no conforto do lar, cinquenta mil livros disponibilizados pela Amazon e todo o acervo de filmes do Netflix. Tirei a sorte grande.

O que não estava planejado no meu sonho era quem faria a comida, quem limparia a casa, quem lavaria a louça. Estou tendo que me virar, mas os livros e tutoriais existem pra isto. Aos trancos e barrancos vou dando conta. Também já tenho outro sonho: uma faxineira assim que possível.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Quem pagou a conta?



Durante muito tempo pratiquei uma estratégia “infalível” ensinada por um amigo para selecionar certo tipo de mulheres. Não me orgulho nem um pouquinho de ter feito isto, pois é uma técnica altamente preconceituosa. Enfim, todos têm sua parcela de defeitos e preconceitos por questionar.

Funcionava assim: quando me interessava por alguma mulher, perguntava se ela gostaria de tomar um café ou bebida comigo. Na hora de pagar a conta, observava se faria algum sinal de dividir as despesas ou não. Nunca as deixava pagar, mas ficava atento. A estratégia era justamente saber se a mulher achava que o homem, pelo simples fato de ser homem, deveria seguir as regras de etiqueta e pagar as despesas da mulher, somente por ela ter nascido mulher.

Naquela época o movimento feminista ainda engatinhava, e a estratégia era simplesmente descobrir com que tipo de mulher estava lidando. Tinha o cuidado de nunca convidar formalmente para o encontro, justamente para descaracterizar o argumento de quem convida paga a conta.  O convite era realizado mais ou menos assim: “topas um café?”, “que tal uma cerveja um dia destes?”.

Certa noite, numa destas investidas, quando chamei o garçom para pedir a conta, já estava paga. Minha companheira de mesa havia acertado tudo enquanto fui ao toalete. Percebendo meu espanto com seu comportamento, ela se adiantou e, sem que eu perguntasse, foi explicando. “Não existe almoço de graça, se alguém lhe paga por algo, vai querer o retorno. Quando a mulher aceita que o homem lhe pague o jantar, subliminarmente está passando a mensagem que talvez um dia vá lhe dar algo em troca”.