terça-feira, 22 de novembro de 2016

Ainda estamos juntos

Sonhei com meu pai. Estava com uma aparência saudável, avental de médico e muito animado. Chamou-me para ver o consultório que montara em seu novo plano existencial. Se quiserem, também podem chamar de céu. Era um consultório nos mesmos moldes que mantinha aqui na terra: papel de parede diferenciado, grande sala de espera, aquário com peixinhos, poltronas confortáveis, diplomas e quadros nas paredes.

Disse-me que demorou quase um ano para se ajeitar por lá, mas que agora já estava em condições de atender seus clientes. Parecia feliz em mostrar sua adaptação.

Despertei e não me preocupei em interpretar nada. Signifiquei apenas que a partida dele foi tranqüila, que estava bem por lá, que mantinha conexão comigo. Passei a manhã inteira animado e com uma sensação de leveza, missão cumprida e proteção espiritual. Bateu uma saudade forte também.

Acontece que sendo filósofo, não pude me furtar de pensar que onde quer que meu pai esteja, seu consultório não terá poltronas, mesas, estetoscópios, quadros. Até onde eu saiba, lá em cima não existe corpo, não há matéria. No sonho, desloquei-me até lá, mas fui com a visão de mundo terrena, com aquilo que conheço, com as idéias que me povoam. 

Não entrei verdadeiramente em sua morada atual, não sei como funcionam as coisas por lá. Para mim é algo muito vago, confuso, misterioso, e até certo ponto, impenetrável para quem ainda reside num corpo. Meu subconsciente fez de conta que fui até lá, mas certamente o consultório dele é bem diferente do que sonhei, o que não diminuiu, de forma alguma, o prazer de sonhar com meu pai.