Eva era uma mulher metódica e
compulsiva, para ela as coisas deveriam ser pretas ou brancas, oito ou oitenta.
Não havia meio termo. As pessoas eram solteiras ou casadas, amigos ou
namorados. Ignorava situações como “ficante”, “peguete” ou “amizade colorida”,
que seriam representadas pela cor cinza. Para ela, cinza era uma mistura de
cores, uma situação indefinida, uma transição para o autêntico. Nada a ver. As
situações da vida precisavam ter cor definida, rótulo e se possível, carimbo de
autenticação. Preto ou branco, solteiro ou casado, amor ou nada.
Conheceu Adão em uma festa, trocaram telefones, conversaram
bastante durante três semanas, sentiram vontade de se ver mais uma vez e marcaram
um encontro para a sexta feira seguinte. Gostaram tanto um do outro, que combinaram
sair de novo no sábado. No domingo,
beijaram-se. Ao se despedir, no portão de casa, Eva perguntou se estavam
namorando, pois para ela, amigos não se beijam. Preto era sinônimo de amigo e
branco significava namorado.
Adão, surpreso com a cobrança, argumentou que ainda estavam
se conhecendo, já considerava Eva mais que uma amiga, porém menos que uma
namorada. Era muito cedo para assumirem um namoro. Eva ficou confusa, pois não
conhecia aquela cor, era um cinza muito escuro, quase preto. Perdeu até a
vontade de beijar. Comunicou que diante do exposto, seriam apenas bons amigos
virtuais, não trocariam mais carinhos e retornou para seu branco existencial.