quarta-feira, 28 de setembro de 2022

Divisão

No primeiro grau da escola aprendi as operações matemáticas: somar, dividir, multiplicar e dividir. A divisão era o inverso da multiplicação, ou seja, separar os elementos de um conjunto em conjuntos menores, repartir determinada quantidade em partes iguais.

Mais tarde a vida me ensinou que nem sempre a divisão era feita em partes iguais, por vezes uns recebiam uma fatia maior que outros. A duras penas, a vida me ensinou também que os homens dividiram o mundo por raça, religião, cor, gênero, ideal político, nacionalidade e que algumas destas fatias se achavam melhores que outras e queriam dominá-las. Algumas até se odiavam. De que adianta saber dividir um cordeiro em partes, se não sabem dividi-lo com seus irmãos?

Surge então a Filosofia Clinica mostrando uma maneira diferente de dividir a vida: divisão de papel existencial. Dependendo do local ou circunstância, o foco e o comportamento podem ser diversos.  Durante o horário comercial sou trabalhador, após as 18 horas fecho a porta do escritório e vou viver minha vida familiar. É a clássica divisão trabalho-família.

No entanto a vida não se divide somente entre trabalho e família, existem subdivisões onde exercemos inúmeros papéis existenciais. Em alguns momentos necessito falar com meu filho como pai, em outros conversamos como velhos amigos. Quando o policial está enfermo e vem consultar comigo sou autoridade, no instante em que a consulta se encerra, da porta do consultório para fora, a autoridade passa a ser dele. Na teoria é muito fácil de entender, mas na prática não é bem assim que funciona. Algumas pessoas não sabem ou não conseguem dividir. Misturam tudo. Outras mais, nem precisam dividir.

Então veio a pandemia e as pessoas foram obrigadas a ficar e trabalhar em casa. Não foi uma opção, na época era uma imposição. Algumas pessoas se atrapalharam, alguns casais se separaram, algumas famílias se dividiram justamente por não saberem dividir espaços, tampouco papéis existenciais. Nem sempre é preciso trabalhar no modelo divisão para que ocorra harmonia, no entanto, o melhor meio de multiplicar felicidade é sabendo dividi-la com outros.

Artigo publicado na edição de primavera/2022 da Revista  da Casa da Filosofia Clinica


3 comentários:

  1. A vida lembra a matemática. Pegamos um problema e nos dedicamos, a conta pode fechar ou pode surgir o resto,
    E quem fica com o resto? Deixa ali, nada é exato, até tentamos fechar os números mas às vezes não dá. Ninguém quer ser o resto, todos querem ser os números perfeitos, aqueles que a conta fecha sem vírgulas.
    Por mais números perfeitos na vida e nos relacionamentos e que o resto se encontre em outra operação.

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  2. Poderíamos dizer que vivemos numa perfeita matemática simbólica? Que me importa se sou 0,001, para outros teremos milhões de percepções ou operações? O que importa, é que possivelmente exista uma selva de probabilidades. A matemática se faz presente até mesmo na Analítica de Linguagem, e que poderá se fazer presente, naquele momento em que, eu fale e o outro não interprete. E com o meu olhar, o outro não saiba calcular minha expressão. Possivelmente somos seres incalculáveis, ou seja, singulares em nossas próprias trajetórias...

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  3. A maioria das pessoas divide suas vidas entre dormir e acordar ou trabalhar e descansar. Para estas pessoas não existe meio termo.

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