quinta-feira, 9 de dezembro de 2021

Desejo

 

Seres humanos vivem para amar – pelo menos na teoria.

Matam por amor – é um fato.

Morrem por amor – também é um fato. Física e espiritualmente.

Afinal, o que é o amor?

Difícil definir, talvez impossível. Mais fácil sentir. Às vezes complicado, confuso, enigmático, mas acessível e naturalmente praticável.

Posso amar um filme, um livro, um vinho, uma pessoa. Mas há uma grande diferença entre amar um livro e amar alguém. Uma diferença abismal. O livro não vai me amar de volta.

Por outro lado, é possível se desejar um livro, um carro, uma bolsa, uma pessoa, com a mesma relevância. Desejo é uma coisa, amor é outra.

Desejo envolve querer algo. Amor talvez seja já estar com alguém. Amar envolve conhecimento, proximidade, conforto, confiança, previsibilidade, segurança, pertencimento. Enquanto isso, desejo pode ser representado por emoção, aventura, novidade, mistério, risco, perigo, surpresa e principalmente imaginação do desconhecido. Desejo = algo. Amor = alguém com nome, rosto, CPF, história em comum.

No inicio o relacionamento era super quente, havia uma atração irresistível, um desejo de se aproximar, tocar, experimentar, possuir. À medida que o casal foi se conhecendo, se tornando íntimo, familiar, previsível, o desejo foi fraquejando até desaparecer por completo. Esta costuma ser a crônica da morte anunciada do desejo.

Desejo e amor podem andar juntos, mas nem sempre. Amor pode existir sem desejo, assim como é possível desejar sem amar. Os desejos de um podem não coincidir com os desejos do outro. Muitos dos nutrientes do amor são justamente os ingredientes que sufocam o desejo e vice versa. Desejo funciona como a lua, às vezes está cheia, depois vira minguante para mais tarde voltar a crescer. Isso sem falar no assombro das eclipses.

Desejar o parceiro inclui uma certa dose de egoísmo, alcançando seu próprio prazer na presença do outro, enquanto no amor a preocupação é dar prazer ao amado, praticando altruísmo na cama e na vida.

O sonho da felicidade humana é justamente este amor romântico transcendental, onde o desejo possa ser único e exclusivo pela pessoa amada e se manter intacto e florescente para todo o sempre.  A má noticia é que não fomos feitos para ser felizes. Felicidade é um desejo humano fruto de nossa imaginação. Somos animais feitos para crescer e nos reproduzir, e para isto o desejo é um componente ancestral genético enraizado em nossos corpos.

O amor, este sentimento delicioso, intraduzível com palavras, surgiu muito mais tarde. Frequentemente renegado, escondido, disfarçado, proibido, vem conquistando seu lugar aos trancos e barrancos. Quem sabe aonde chegará? Navegar no contraste entre o desejo da novidade e o calor humano é o grande desafio na evolução do amor.

Precisamos conviver com essa realidade. A felicidade que encontramos é aquela que conseguimos construir. E se quisermos,  podemos construir boas relações.

8 comentários:

  1. Amor atrai, desejo trai.

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  2. Se quer alguém por sua beleza, não é amor, é desejo.
    Se quer alguém por sua inteligência, não é amor, é admiração.
    Se quer alguém porque é rico, não é amor, é interesse.
    Se quer alguém e não sabe porque, isso é amor.

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  3. Se Deus criou o desejo
    Por que que é pecado o prazer?
    Nos pôs mil palavras na boca
    Mas que é proibido dizer

    A lógica da criação. Oswaldo Montenegro

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  4. Lembrei daquela frase:
    Desejo que você tenha a quem amar.
    E você tem.
    Ame-se

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  5. Ótima reflexão. Certa vez um professor, grande amigo, me perguntou se eu sabia o queria? Não sei ao que ele se referia, porém minha mente se direcionou ao "amor", respondi que SIM. Eu sei o quero e COMO EU QUERO! Penso que isso tudo não tem uma fórmula certa, simplesmente acontece, e se não vai adiante é por motivos circunstanciais. O amor termina pela distância? Ele sucumbe aos maus-tratos? Ele termina pela indiferença? Ele atormenta ou apimente pelo ciúme? O olhar em direção ao outro é construídos por nossas ilusões? Muitas vezes admiramos por trás de uma vitrina, porém com a aproximação vemos pouco ou muito de nós mesmos no outro? O mundo das ideias é farto neste assunto. Porém cada um pensa e sente o amor a sua maneira, e nada melhor que a aproximação para termos uma pequena fração de seu real valor. O outro é uma incógnita? Penso que seja, aquilo que se desconhece e se busca saber, grandeza a ser determinada em uma solução.

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  6. Amor e desejo são coisas diferentes. Nem tudo o que se ama se deseja e nem tudo o que se deseja se ama.
    Miguel de Cervantes

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  7. O desejo cessa assim que alcançado, o amor só aumenta

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