Escrever não
é fácil. Às vezes passo uma tarde inteira tentando lapidar uma única frase,
procurando o ritmo certo, a palavra que falta, o tom que faz tudo ganhar
sentido. E, mesmo assim, muitas vezes o resultado não me convence.
Reescrevo.
Corto. Recomeço do zero. São tardes e noites inteiras entregues às palavras. Escrever
é assim: um exercício de paciência, solidão e entrega, onde o tempo deixa de
ser cronológico e passa a ser interior.
Mas, nessa dedicação quase obsessiva às palavras, fui perdendo o mundo fora delas. Troquei cafés por capítulos, abraços por parágrafos, pessoas por páginas. A vida foi ficando silenciosa, só eu e o ruído seco das teclas.
Então decidi
que precisava equilibrar as coisas. Escolhi uma tarde por semana pra estar com
quem me faz bem. Sem celular, sem digitar. Só presença, conversa e risada.
Mas a verdade é que viver essa frase perfeita é tão ou mais difícil que escrevê-la. Quando tento marcar algo, quase todos têm compromissos, reuniões
urgentes, prazos apertados. Aquela correria de sempre. A vida adulta inventou
um cronograma que não deixa espaço para o encontro.
Perdemos o hábito de escutar, agora ouvimos
com os olhos através das telas. É mais prático
trocar mensagens curtas do que sustentar uma conversa longa. E, quando
recebemos uma gravação, aceleramos o áudio, como se ouvir o outro sem pressa
fosse perda de tempo. A escuta está virando um ato em extinção.
Às
vezes penso nos encontros que nunca saíram do papel. Nas tardes que ficaram prometidas, mas nunca chegaram. Lembro de uma pessoa que eu queria muito ver. Combinei, insisti, esperei. Quando
finalmente nos encontramos, percebi que já era tarde demais. Ela estava ali,
mas algo em nós dois já não estava.
E
é isso que mais dói: descobrir que a ausência vai crescendo devagar, pelas
brechas, se instalando no silêncio, até que um dia você olha para alguém
querido e percebe que deixou passar capítulos inteiros da vida dele enquanto
escrevia os seus. E não existe palavra perfeita que desfaça esse tipo de
distância.
Por
isso eu fico aqui, do lado de cá da tela, esperando ouvir algo simples, mas que
se tornou o luxo máximo do nosso tempo:
“Vem agora. Larga tudo. Estou te esperando. Vamos tirar a tarde só pra nós.”
Enquanto
a vida não me dá esse "sim" presencial, eu sigo escrevendo. Não porque a escrita substitua a presença, mas
porque escrever é meu jeito de chamar o mundo de volta.
Talvez,
no fim, escrever seja só isso mesmo: uma tentativa de não deixar o silêncio
tomar conta, uma forma de ensaiar o reencontro. Porque um dia, quem sabe, alguém
há de escutar, e vir.
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