segunda-feira, 10 de junho de 2013

Namorados para sempre

Conheceram-se pela internet. Moravam em países diferentes, tinham vinte anos de diferença de idade, falavam, torciam, votavam e rezavam para Deuses distintos. E mesmo com tudo diferente, os dois se falavam todo dia e a vontade de ficar juntos crescia, como tinha de ser. Estavam apaixonados e juravam que opostos se atraem e se completam. Quem disse que existe razão nas coisas feitas pelo coração? Apostaram nisto e decidiram casar. Familia, amigos e preconceitos jogavam contra, previam um choque cultural seguido de desilusão com a convivência conjugal.

Recomendaram um curso preparatório de noivos, O casal estava tão entusiasmado, que qualquer motivo para ficarem juntos era bem aceito. Logo na primeira aula, o rabino, um senhor de meia idade,  com uma longa barba ruiva e sotaque meio russo, meio francês, comunica  ao jovem casal, em tom solene e ao mesmo tempo suave,  que se quiserem mesmo casar, terão de fazer uma escolha: “ Felizes” ou “Para sempre”. Uma opção ou outra, as duas juntas não combinavam. Aquele final tradicional dos livros românticos, casaram e foram felizes para sempre, só existia no papel. Na vida real essa possibilidade era muito remota. Deveriam, naquele momento, se conscientizar e escolher entre um relacionamento estável que lhes trouxesse paz ou uma vida de romance que acelerasse seus corações. 

Foram pegos de surpresa. Estavam cheios de expectativas felizes para a nova vida que se anunciava e agora, de onde menos esperavam, recebem um balde de água fria. Queriam e sonhavam ser felizes e sequer cogitavam uma separação.  O rabino percebendo o mal estar, ofereceu uma xícara de chá com limão e continuou sua prédica.  Casamento é como tocar  violino em cima de um telhado, é preciso ficar tentando arranhar uma simples e bela melodia, enquanto se cuida para não cair e quebrar o pescoço. 

Como manter o equilíbrio? O amor é quem vai sustentá-los. Alguns dias dançarão felizes, em outros precisarão se abraçar para não caírem, talvez precisem jogar fora o violino, mas o amor vai mantê-los firmes no telhado. Não existem garantias, apesar da precariedade da incerteza, tudo pode ser refeito, recomeçado. Sob a perspectiva do medo, nada será suficientemente seguro, sob a perspectiva do amor, nada é necessário.

Ainda inseguros, decidiram deixar de lado a religião e casar apenas no civil. Consultaram um advogado, amigo da família, que aconselhou o regime de separação total de bens acrescido de algumas cláusulas específicas protetoras em caso de divórcio. As chances  da união do jovem casal funcionar eram de apenas cinqüenta por cento e deveriam se resguardar de um possível fracasso amoroso.

Apavorados com os riscos, sabiam que não tinham mais para onde correr. Teriam que escolher entre desistir ou apostar naquilo que sentiam um pelo outro. Quando o amor precisa acontecer, sabe onde e como encontrar os amantes.. Não adiantava fugir. Além disto, existem os riscos que jamais se deve correr, mas existem também aqueles  que não se pode deixar de correr. Decidiram simplesmente morar juntos. Formar um casal.  Dividir e compartilhar armários, despesas, emoções.  Nada de formalidades, apenas a vontade de dar certo.

Estão juntos há 15 anos.
Ele trabalha numa fábrica de computadores. Ela largou o emprego.
Ele engordou 20 quilos. Ela precisou tirar um seio.
Ele faz as compras no supermercado. Ela busca os filhos na escola.
Ele faz o jantar. Ela dá banho e põe as crianças pra dormir.
Ele abre um vinho. Ela coloca uma musica.
Eles se beijam.

Livre adaptação das músicas Eduardo e Mônica - Legião Urbana e Violinista no telhado - Jerry Bock e Sheldon Harnick



4 comentários:

  1. muito legal, ildo!

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  2. Tô gostando do teu Blog. São histórias que ocorrem ao nosso redor... Parabens.
    Benjamin

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  3. Lindo texto Dr.Ildo ! Bem como a vida é !! Grande beijo

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