sábado, 29 de setembro de 2007

Marketing para o Anestesiologista




Os dois grandes ramos da Medicina sempre foram a Clinica e a Cirurgia. Quase a totalidade dos médicos dedicava-se ao estudo da técnica e clínica cirúrgica ou clinica médica, e relegavam a anestesia a um plano secundário. Enfermeiras, estudantes, religiosos eram encarregados de praticar anestesia, e o faziam de maneira muito precária. As deficiências eram múltiplas: formação anestésica inadequada, falta de medicações seguras, inexistência de monitores e aparelhos de aplicação de anestesia fidedignos. Em mãos não habilitadas, a administração de anestesia torna-se muito perigosa, e, como conseqüência, ocorreram vários acidentes; óbitos, seqüelas físicas (plegias, atelectasias, pneumonias, insuficiências renais, enfartes, etc) e psicológicas.

Evidências concretas criaram a fama de que a anestesia era perigosa, e sempre haveria o risco de alguma complicação anestésica durante o procedimento cirúrgico. Em épocas de carência de conhecimento médico e desinformação da população, tornou-se cômodo imputar qualquer infortúnio no período peri operatório como conseqüência da utilização da anestesia. Expressões tais como "Não resistiu à anestesia", eram utilizadas para explicar tanto complicações por hipotensâo devida a vasodilatação como por hemorragias intensas.

A evolução da anestesia para uma especialidade médica com formação específica, a criação de entidades associativas, o conhecimento mais aprimorado do mecanismo de ação e efeitos dos anestésicos e medicações adjuvantes, o surgimento de medicamentos mais seguros, a monitorizaçâo mais ampla e fidedigna e a aparelhagem anestésica com recursos de precisão, fizeram com que a morbi/ mortalidade da anestesia decaíssem sensivelmente. Eventualmente ainda ocorrem acidentes, e quando acontecem, geralmente a equipe médica não fornece informações imediatas e precisas, favorecendo que familiares e mídia passem a divulgar suas versões, que realimentam a fama da anestesia ser perigosa.

0 anestesiologista, ao invés de ser visto como um médico especialista que cuidará do bem estar e das funções vitais do paciente durante o peri-operatório (um guardião do sono), é muitas vezes confundido como o "vilão" do procedimento cirúrgico.

Além destes fatores relacionados à insucessos, existe um agravante. A anestesia faz parte de uma categoria de produtos e serviços não desejados. Ninguém submete-se a uma anestesia por desejo, e sim, por necessidade absoluta. Algo que não é desejado e ainda pode ser perigoso, faz com que as pessoas se afastem.

Marketing, na sua versão mais simplista, significa "dar-se" para o mercado, "mostrar-se", "oferecer-se". Em uma operação exitosa de marketing, o cliente deve ter anseios de obter o produto/serviço oferecido. Em outras palavras, o produto/serviço "vende-se" por si mesmo.

Não se deve confundir marketing com propaganda e vendas. Uma série de estratégias e ações são efetivadas dentro de um planejamento de marketing, sendo a mídia o final de um processo. As estratégias de marketing podem iniciar até mesmo antes do produto existir. Na área médica, a utilização da mídia como marketing, talvez seja a ação menos importante.

0 objetivo deste estudo é colocar o marketing (arte de fazer com que o cliente deseje determinado produto) à serviço da anestesia (produto não desejado e potencialmente perigoso).

0 marketing vem em socorro da anestesia para melhorar sua imagem, fazer com que a anestesia se "venda" melhor e aprofundar o relacionamento com a sociedade.

0 anestesiologista em seu trabalho diário é um representante da categoria e seu comportamento profissional, reflete-se na imagem da especialidade. 0 relacionamento com pacientes, familiares, cirurgiões, clínicos, enfermagem, indústria farmacêutica, direção hospitalar, planos de saúde, imprensa e colegas anestesiologistas, formará a imagem do profissional, que indiretamente espelhará o padrão da especialidade. Um profissional mal orientado pode prejudicar todo o trabalho de uma categoria.

Baseados na premissa de que atitude e comportamento determinarão a formação e propagação da imagem do profissional e da especialidade, orientações no sentido de superar as expectativas do cliente, contribuirão para reverter a imagem "negativa" da anestesia, resultado de décadas de obscuridade tanto do saber anestésico como do próprio anestesiologista que mantinha sua atividade restrita à sala de cirurgia.

A relação do anestesiologista com o paciente é pobre em quantidade, porém pode ser riquíssima em qualidade. 0 paciente, via de regra, entra em contato com o anestesiologista em virtude da necessidade de uma cirurgia. Nesta situação, iniciam-se todos os temores em relação à anestesia, frutos da bagagem de informações adquiridas ao longo de suas vivências. 0 resultado costuma ser um paciente ansioso, carente, receoso de entregar o controle de sua vida à um estranho que realizará um procedimento potencialmente perigoso.(

Exatamente neste momento (paciente no auge de sua ansiedade), é quando o anestesiologista tem a oportunidade de, entendendo a situação do paciente, relacionar-se de maneira a oferecer conforto, segurança e conhecimento, modificando a imagem de "vilão" para "protetor da saúde do paciente".

Empatia significa tratar o paciente como gostaríamos de ser tratados, e a empatia pode ser alcançada através de atitudes muito simples: chamando o paciente pelo nome, olhando nos olhos, escutando com atenção, tocando o paciente, não utilizando termos técnicos de difícil compreensão. Firmar compromissos também é importante: assegurar presença e constante vigilância ao lado do paciente durante todo o procedimento, prescrição de analgésicos, localizaçâo imediata no pós operatório, se necessário.

Adquirir a confiança do paciente é fundamental para o sucesso do tratamento, porém, confiança não se pede, conquista-se. Alguns minutos de anamnese e exame físico são suficientes, desde que o médico esteja realmente neste tempo somente focado no paciente e faça-o sentir seu interesse. A medicação pré-anestésica e a anestesia propriamente dita poderão ter suas dosagens diminuídas, dependendo do grau de confiança conquistado.

Recomendações relativas à jejum, uso ou interrupção de medicamentos, data e horário da cirurgia devem ser entregues ao paciente de maneira escrita. Folders explicativos referentes aos tipos de anestesia, importância do jejum, cuidados pré e pós operatórios, complicações, etc podem ser entregues ao paciente ao final da consulta. A assinatura do consentimento informado da realização da anestesia é um procedimento indicado.(4) Todo o material impresso é importante, na medida em que tangibiliza o serviço realizado. 0 paciente sente-se mais seguro ao sair de uma consulta com instruções escritas, ao mesmo tempo em que o nome, endereço e telefone do anestesiologista ficam registrados no material impresso.

0 consultório é o local ideal para a realização da avaliação pré anestésica, e seu uso deve ser estimulado através da criação de salas específicas com sinalização adequada dentro de hospitais, ou consultórios privados, onde rotineiramente todos os pacientes candidatos à cirurgia eletiva sejam avaliados.

0 crescimento da área de atuação do anestesiologista, sendo agora responsável pelo peri-operatório e não apenas pelo trans-operatório como no passado, trouxe um envolvimento maior com pacientes, familiares e equipe médica, favorecendo o reconhecimento e divulgação de seu trabalho.

Cuidados no pós operatório são fundamentais. As recordações que o paciente guarda da anestesia, são do período pré e pós anestésico, visto que, via de regra, durante a cirurgia o mesmo se encontra sedado ou dormindo. Prescrição de medicaçâo anti-emética, analgesia, hidratação, manutenção da homeostasia, ansiolíticos, trazem conforto e bem estar ao paciente, fazendo com que as lembranças da internação hospitalar e da anestesia possam ser agradáveis.

Acompanhamento no Centro de Recuperação e na Unidade de Internação após o procedimento, trazem a oportunidade de divulgação da especialidade através da atuação do médico e do esclarecimento de dúvidas. Nesta ocasião é importante demonstrar preocupação com a satisfação do cliente e qualidade do serviço oferecido, pois serão os determinantes da imagem formada e propagada pelo paciente.

A evolução do conhecimento científico deve ser estimulada e demonstrada. Criação de Serviços de Anestesia em hospitais, discussões de casos clínicos com a equipe cirúrgica, desenvolvimento de protocolos específicos, realização seminários e palestras de atualização e/ou revisão, estímulo à pesquisa, estágios e congressos são ações que facilitam a percepção do desenvolvimento contínuo da especialidade. 0 conhecimento médico deve ser percebido tanto por colegas de outras especialidades como pela população leiga. Programas de esclarecimento à comunidade através da imprensa, palestras, exposições, auxiliam o processo de divulgação do aprimoramento e segurança alcançados pela anestesia.(5)

Entidades associativas assumem papel fundamental demonstrando organização, liderança e representatividade junto a organizações médicas, governamentais e privadas. A participação efetiva dos anestesiologistas fortalece as Sociedades Regional e Nacional.

Excelência no atendimento, pontualidade, aprimoramento e divulgação do conhecimento científico, empatia, coleguismo, conscientizaçâo do trabalho em equipe, tangibilização, participação associativa, são atribuições diárias de um profissional.(6) 0 reconhecimento do valor e da qualidade de um médico por colegas e pela população será o sinalizador de que seu trabalho está atingindo ou mesmo superando as expectativas e contribuindo para elevar o grau de confiança em sua especialidade.
Leia mais no meu site: www.ildomeyer.com.br

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