segunda-feira, 30 de maio de 2011

Como acabar com a concorrência

Todo palestrante precisa saber que em algum momento de sua carreira vai enfrentar situações constrangedoras. Uma pergunta de cunho pessoal, um microfone que não funciona, um branco na memória, uma imagem trocada na tela...Com o tempo, a experiência vai ensinando a contornar com leveza e humor estes contratempos.

Nem sempre. Certa ocasião, minutos antes de iniciar uma palestra de Marketing para Médicos no interior de São Paulo, recebi o telefonema de um ginecologista local perguntando se havia a possibilidade de recebê-lo antes da apresentação. Combinamos um breve encontro e ele foi direto ao assunto:

- Quanto o senhor está cobrando por esta palestra?  Pago o dobro para que o senhor não se apresente, vá embora da cidade e não ensine nada de marketing para meus colegas. Quero uma aula particular, assim vou ganhar a concorrência.

 Fiquei tão espantado com a proposta que quase perdi a voz. Não sabia direito como responder, mas tinha muito claro que não poderia frustrar a platéia que me aguardava. Sugeri que assistisse à palestra e ao final teríamos uma conversa reservada sobre seus objetivos profissionais. Lembro até hoje dele contrariado, sentado na última fileira do salão com o rosto preocupado a cada dica que era fornecida aos “concorrentes”.

Transcorridos vinte minutos da apresentação, perguntei à platéia quantos eram ginecologistas. Aproximadamente 30 levantaram o braço. Comentei então que as estratégias ali ensinadas permitiriam um salto de qualidade na gestão de suas clinicas, bem como um aumento na captação e manutenção de pacientes. Os ginecologistas que, por um motivo ou outro, não estavam assistindo à palestra, seriam privados destes conhecimentos e ficariam em desvantagem no mercado, porém entre os presentes, a competição continuaria existindo.

Se todas as informações e projetos fornecidos fossem levados ao pé da letra e implantados como um manual de marketing, o resultado final seriam serviços e produtos similares, com qualidade semelhante, secretarias padronizadas e resultados muito próximos, cada qual buscando melhorar sua lucratividade através da redução de custos e superação dos concorrentes em algum detalhe.

 Quem sabe não seria mais proveitoso cada médico contratar um profissional de marketing exclusivo para auxiliá-lo a superar a concorrência e atrair só para si as preferências dos pacientes? Deixando de lado a hipocrisia, não é o sonho de todo o profissional eliminar de vez seus oponentes?

Silêncio na platéia. Sorriso na face do Dr. Carlos (nome fictício do médico que queria me persuadir a cancelar a palestra). Meu objetivo com esta pergunta não era divulgar nem oferecer serviços de marketing, queria mesmo era provocar a audiência, estimular o espírito competitivo. Aproveitei a oportunidade e lancei outra pergunta: Existe concorrência justa e leal?

Não existem duas pessoas iguais. Serviços também diferem. Como falar em competição justa se os adversários não são iguais? Um será melhor em determinado aspecto, outro terá mais qualificações, um terceiro será mais experiente. Colocam-se as regras da disputa, lança-se o desafio, e que vença o melhor. Em tese, o melhor leva vantagem na competição.  A pergunta é: - Como saber quem é o melhor?

A resposta veio rapidamente da platéia: - Aquele que vencer a disputa será o melhor.

Será mesmo?  Quem vence uma partida “é” o melhor ou “está” melhor naquele momento?

 Entre diferentes acontecem alternâncias de superioridade e a balança pode oscilar de um lado para o outro. Nem sempre o favorito sai vencedor. Se a “zebra” estiver melhor naquele momento, pode aproveitar a vantagem e alcançar a vitória.  Esta é a graça das disputas: o inusitado. A única competição verdadeiramente justa e igual é consigo mesmo.

 Em nossa vida pessoal e profissional, competimos conosco ou contra outros? Quem são eles? Quem é o juiz desta batalha? Quais são as regras?

As regras do jogo mudaram. Competição não é mais o colega ginecologista tentando captar seus potenciais pacientes, nem é o vizinho tentando lhe ultrapassar numa corrida. “Competição hoje é quando alguém vem de uma direção qualquer, bate no seu carro e lhe tira da pista” – Tony Wheeler.

  Floriculturas amargaram prejuízo no dia de finados, pois não contavam com a concorrência desleal de ambulantes nos cemitérios. Pacientes com problemas cardíacos na Alemanha, Canadá, Estados Unidos pegam um avião e vão se operar na Índia, pois os preços lá praticados podem chegar a 10% do valor cobrado em seus países.

A estratégia de vigiar o concorrente, fazer visitas, utilizar cliente espião, entrar em guerra de preços, tem uma relação custo benefício muito alta, enfraquece toda a categoria e já não tem a mesma eficácia. Consome-se muita energia olhando para o lado, deixando que o oponente determine qual deve ser nosso próximo desafio.  Sempre haverá um “colega” trabalhando por menos, um comprador de serviços oferecendo menos ainda e um concorrente inusitado se atravessando no caminho.

Concorrência não é produto de um mercado capitalista. Existe na natureza, em qualquer eco sistema, em todos os sistemas econômicos e não vai desaparecer tão cedo. Funciona como o engodo da economia, estabelecendo e equilibrando preços de todos os recursos produtivos, desde os medicamentos utilizados até os honorários médicos.  O problema não é a quantidade da concorrência, mas a forma como é praticada: destrutiva ou construtivamente.

Ginecologistas são colegas de profissão e de especialidade, e não devem agir como concorrentes.  Os clientes que freqüentam seus consultórios e pelos quais equivocadamente disputam a preferência,  correspondem à demanda já existente e representam apenas 10% do mercado. Esta é uma concorrência destrutiva, pois termina com a riqueza.  

  A concorrência que assume formas produtivas é aquela que cria a riqueza. Restam ainda escondidos e inexplorados todos os não clientes, que correspondem a mais de 90% de possíveis novos pacientes. A economia moderna funciona tanto num sistema de concorrência como de cooperação e o segredo deste equilíbrio é criar demanda ao invés de disputá-la. 

Desculpem o trocadilho, mas hoje “con-correr” significa muito mais “correr com” do que “correr contra”. Isoladamente teremos menos força, apoio e recursos para criar, conquistar e manter novos clientes. Melhor nos unirmos que nos destruirmos. Gostaria de encerrar com uma pergunta e um desafio: Onde estão os clientes em potencial? Como disse Charles Darwin, “não é a espécie mais forte que sobrevive, nem a mais inteligente, mas aquela que responde mais rápido às mudanças”.

O que aconteceu com Dr. Carlos? Nunca mais tive noticias dele até ontem, quando recebi a seguinte correspondência: “Dr. Ildo, é com muita honra que gostaria de lhe comunicar a fundação da Cooperativa de Ginecologistas de nossa cidade, entidade da qual sou o primeiro presidente. Aproveito a oportunidade para convidá-lo a palestrar novamente, desta vez deixando de lado a concorrência e nos respondendo à sua última e talvez  mais importante interrogação: - Onde estão os clientes?













2 comentários:

  1. Gostei do texto. O tão chamado "diferencial" que muitas vezes buscamos no nosso cotidiano profissional, visa tornar-nos diferentes, no sentido de singulares, de inéditos e não no sentido de melhores que os nossos colegas. Concordo plenamente que preciso superar-me constantemente sem que o olhar para os lados me torne mesquinha, anti-ética e ressentida.
    Obrigada por alargar nossos horizontes.

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  2. Simplesmente fantástico a forma como abordou o assunto concorrência e clientes potenciais. Trabalho com vendas e gerenciamento de equipe e há muito tempo não leio um artigo tão verdadeiro e ao mesmo tempo tão produtivo. Parabéns!

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