quinta-feira, 25 de outubro de 2007

DESCOMPORTE-SE

Em tese, comportamentos tem, intrinsecamente uma função.
Beber água (comportamento), com a função de matar a sede.
Beber cerveja (comportamento) para esquecer alguém (função).
Estudar bastante (comportamento) para passar no vestibular (função).
Vestir-se bem (comportamento) para impressionar (função).
Porém, nem sempre a relação entre comportamento e função é facilmente identificada e de simples compreensão.

Grande parte dos comportamentos são desempenhados sem raciocínio. Manifestam-se como um ato reflexo, quase que automático, não havendo um planejamento consciente e minucioso nem tempo hábil para ajustes e testes de desempenho de forma a antever que aquele comportamento irá conduzir a um objetivo específico e desejado.

Vale lembrar que comportamentos são a exteriorização da personalidade, portanto sujeitos a interferências de formação educacional, familiar, social, cultural, aliadas a fatores de ordem interna, tais como emoções, pré-juízos, sensações, os quais são acionados e combinados nas mais diversas situações, gerando comportamentos que nem sempre tem ou guardam relação direta e lógica com funções.

Algumas pessoas passam uma vida inteira se comportando de determinada maneira, enquadradas em algum raciocínio sofista, buscando cumprir funções completamente absurdas e irreais.
Assim, podemos ter comportamentos que não gerem funções, comportamentos que gerem mais de uma função, e até mesmo, funções não relacionados a comportamentos.

Compreendendo que um comportamento nem sempre remete a uma função e vice-versa, como saber se um comportamento está vinculado a uma função?

É preciso um comportamento estar relacionado a um objetivo definido?

Ingerir bebidas alcoólicas tem somente a função de esquecer algo?

Vestir-se bem deve estar relacionado somente ao fim de impressionar os outros?

Estes questionamentos levaram a uma inquietação e forçaram uma visão mais ampla do assunto: A separação entre comportamento e finalidade/objetivo/função, poderia abrir novas perspectivas.

Durante a guerra do Golfo, a rainha-mãe do Sultanato de Omã, país aliado dos Estados Unidos, adoeceu e foi transferida para tratamento em Washington (EUA). Após a alta hospitalar, com a finalidade de dar uma continuidade no tratamento, foi desenvolvido um sistema de tele-medicina. Computadores e câmeras digitais interligando hospitais de Washington e Mascate (capital de Omã), permitiram que fossem transferidas eletrônicamente informações médicas, inclusive imagens digitalizadas, colocando a paciente de maneira a ser "vista" com a frequência necessária.

O comportamento tradicional da relação médico-paciente é presencial, ou seja o paciente frente a frente com o médico. O objetivo é o diagnóstico e tratamento. Geralmente comportamento e função estão associados em uma instituição médica. Neste caso, tivemos a preservação do objetivo/função (diagnóstico e tratamento) com o comportamento assumindo um novo formato (computadores e redes de alta velocidade).

Depois deste episódio inicial do uso da tele-medicina surgiram cirurgias a distância com robôs, video-conferências, consultas a distância, preservando a finalidade da medicina, mas agora com alteração comportamental.

Desvinculando, procurando novos comportamentos para determinadas funções, surgiram grandes descobertas, que permitiram a evolução da humanidade, mas, ao mesmo tempo, provocaram grandes confusões comportamentais.

Promessas de campanha eleitoral em troca de votos, de mordomias no céu após a morte em defesa da pátria, de status após a compra de determinado produto, de beleza após determinado tratamento, podem funcionar como maquiagens para se obter determinado tipo de comportamento. Metas ilusórias ou ilusões funcionais, criadas pela própria pessoa ou por outros para justificar ou induzir determinados comportamentos, que eventualmente alienam e servem de consolo aos iludidos.

Qual a importância de desvincular comportamento e função?
Liberdade.
Liberdade para se comportar sem preocupação específica com determinada função.
Liberdade para procurar tipos alternativos de comportamento que proporcionem as mesmas ou outras funções, e acima de tudo, liberdade para identificar e corrigir comportamentos anômalos e equivocados.
Sinta-se livre para comportar-se ou, se quiser, descomporte-se.
Leia mais no meu site: www.ildomeyer.com.br

Um comentário:

  1. "Compreendendo que um comportamento nem sempre remete a uma função e vice-versa, como saber se um comportamento está vinculado a uma função?" I.M. Fiquei a imaginar o quanto disso já reproduzi em minha vida. Incontáveis vezes, durante a vida, com meus papéis existenciais, sempre foi esperado que me comportasse de determinadas formas em determinados lugares e circunstancias. Padrões morais e éticos. Outro dia, ouvi um rapaz relatar que, em sua infância, havia feito de tudo para agradar a mãe, em busca de sua atenção. E sua namorada disse-lhe, mas as mães amam seu filhos igualmente, você não necessitava ter se empenhar tanto. Pensei com meus botões: só ele sabe o quanto se empenhou para conquistar o amor materno. Dessa forma penso que ao ler, pretendo compreender e isso poderá ser acrescido de satisfação, e a cada um poderá referir-se a uma forma de pensar,sentir e agir. Um belo momento de reflexão...

    ResponderExcluir