Hoje não acordei bem. Senti um aperto na altura do
estômago, uma sensação de saciedade e uma preguiça daquelas que nos aprisionam
na cama. Olhei o relógio e vi que passavam das nove, mas não tinha a menor vontade
de levantar. Queria mesmo era voltar a dormir pra ver se acordava melhor.
Não consegui. O pessoal que trabalha na pousada já
estava circulando pelo corredor, especialmente dona Maria, que enquanto limpa
os quartos, cantarola muito alto e faz alguns barulhos que me atrapalham o
sono.
Além disso, fiquei pensando o que poderia ter
causado aquele mal estar. Rolava na cama de um lado para outro enquanto tentava
lembrar o que comera no dia anterior.
A noite havia sido ótima, não exagerei na comida
nem na bebida. A única coisa diferente foi aquele vinho verde português servido
durante o jantar. Tão logo vi aquele liquido verde na taça, estranhei a cor. O
garçom percebeu minha estranheza mas foi esperto e atencioso. Rapidamente saiu
explicando como era a fabricação e envasamento da bebida.
Fui convencido a experimentar. O gosto era um pouco
adocicado, porém suave e desceu redondinho. A conversa e a boa comida exigiam acompanhamento
de um vinho daquela categoria. Não deve ter sido o vinho. Quem sabe algum
ingrediente da comida?
O aperto no estômago continuava, o barulho no
corredor aumentou, a cama começou a ficar desconfortável, então decidi levantar
e tomar um chá. Vesti aquela bermuda vermelha que comprei na feira de Lisboa,
uma camiseta qualquer, calcei os chinelos e desci para a cafeteria. Não tinha
disposição para me arrumar melhor.
Sentei naquela mesa perto da janela onde
costumávamos tomar café todas as manhãs. Sabia que hoje seria diferente, pois
não estarias ali comigo. Ao ver teu lugar vazio, perdi até a vontade de tomar
chá. Olhei para o resto do salão e percebi que também estava vazio. Até a
música clássica que estava tocando e que curtíamos, já não era mais tão
tranqüilizadora.
O vazio da tua ausência estava se alastrando pela
casa e pelo meu corpo. Num gesto de desânimo, baixei a cabeça como quem vai
chorar e quer esconder o rosto. Neste instante, percebi um envelope com meu
nome em cima da mesa, escrito com tua letra.
Foi bom receber aquela surpresa, mesmo sabendo que
seria uma despedida. Nem sabia o que estava escrito, mas era como se ainda
estivesses ali, me fazendo companhia. Abri rapidamente o envelope, num gesto
esperançoso de que magicamente fosses sair dali de dentro.
Não podia imaginar que ali estava a receita para
curar minha dor. Três pequenas palavras milagrosas: “Para Sempre Tua”. O problema não era a comida, minha fome era
outra.
#parasempre#tua#
ResponderExcluirPode o fruto proibido, nos causar tamanho desconforto? Ou este é o sabor da vida, que nos atira sobre os encontros e desencontros?
ResponderExcluirUAU...!! Quero saber a sequência.....
ResponderExcluirSr Ildo. Muito giro o texto. Conheço bem o vazio no corpo e na alma. A falta do calor que preenchia por completo meu corpo, sempre sorrindo. Eu a perdi, tarde demais, não é pra sempre minha, já pertence a outro. A rapariga partiu. Nuno
ResponderExcluirInteressante o existencial de cada ser. Algumas pessoas tem a facilidade de se expor em constantes relacionamentos outra já nem tanto. Teria sido algo tão grandioso se não houvesse terminado? Ou seria apenas uma aventuras daquelas que alguns costumam vivenciar durante as viagens. Porém aquele que tem os pés no chão, e que possivelmente leve consigo a certeza daquilo que anseias, não importando o tempo que leve para que este desconforto passe e logo possam estar juntos novamente. Mas o tempo, esse resolve quase tudo, dando oportunidade de ajustar e revelar se foi realmente para sempre...
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