quarta-feira, 5 de agosto de 2015

A gente não faz amigos, reconhece-os.

Facebook informa: Carlos Alberto lhe enviou uma solicitação de amizade.

Querido Carlos:

Agradeço sua solicitação, mas infelizmente não  posso aceitá-lo agora, de imediato, em minha lista de amigos. A amizade, assim como a confiança, não chega através de um mero pedido. Envolve um elenco de condições que não cabem na formalidade de um protocolo. Não são qualidades, ações ou comportamentos adequados ou rigidos que vão determinar o vínculo da amizade.

São os sentimentos que brotam em conjunto, sem preocupações acerca de como ou porque iniciaram ou quanto tempo vão durar. Atingida esta cumplicidade inexplicável, surge um princípio de verdade e a amizade torna-se vitalícia.


Meus amigos só deixarão o posto quando morrerem, e torço para que este dia nunca chegue. Até mesmo quando não estiverem mais nesta vida terrena, a amizade continuará nos unindo.

Procuro fazer com meus amigos o que faço com bons livros. Guardo-os com todo o cuidado e carinho onde os possa encontrar. Sei que quando precisar, estarão ali, a meu lado. Incondicionalmente. A recíproca também é verdadeira, não os abandonarei, tampouco os deletarei, por menor que seja o tempo que a mim dediquem. Como podes ver, é uma lista sagrada e seleta. 

Quando lançaram o facebook, achei interessante acumular o maior número possivel de amizades virtuais. Pensava utilizar essa midia social como ferramenta para divulgar meu trabalho. Aceitava todas as solicitações e pedia para ser incluido em várias listas. A experiência não me agradou. Logo atingi a cifra de quase mil "amigos desconhecidos". Inventei este apelido afetuoso para designar pessoas ou entidades com as quais nunca troquei duas palavras mas que anualmente enviam mensagens automáticas de “Parabéns” ou “Felicidades” na data do aniversário e curtem toda e qualquer postagem.

Já que estamos em processo de inicio de amizade, vou aproveitar e fazer uma confidência: não curto mais este tipo de relação e pretendo realizar uma depuração nestas aproximações ilusórias e cortesias mecânicas.  Aristóteles, filósofo grego, já dizia: "quem tem muitos amigos, não tem nenhum".
Portanto, não acho justo incluí-lo numa lista tão distante e despretensiosa.


Mas posso te fazer uma boa proposta. Que tal te colocar na minha lista de conhecidos? Todas minhas amizades começaram assim: nos cruzamos por acaso, fomos estreitando os laços, e, quando nos demos conta, já éramos amigos. Não sei quem disse a frase, mas gosto dela: “a gente não faz amigos, reconhece-os”.

Por favor, não me interprete mal pensando que sou esnobe, arrogante ou pernóstico. Estou apenas valorizando uma verdadeira amizade e dando-lhe a devida importância no contexto desta tendência atual de encontros e desencontros cada vez mais virtuais.

Numa época em que as pessoas se aproximam para assaltar, reclamar, pedir, bisbilhotar a vida alheia, ou, no sentido inverso, não chegar perto de ninguém, isolando-se em seus próprios mundos, um pedido sincero de amizade precisa ser celebrado e levado muito a sério. Ser honrado com o título de amigo é uma conquista inestimável e digna de poucos.

Voltando a pergunta inicial: quero ser seu amigo? Claro que sim.  Tomara que sim. Vamos nos esforçar para que sim. O resto deixamos por conta da vida, do tempo, da sorte.

Muito, mas muito agradecido mesmo pela proposta, fiquei envaidecido com a distinção da escolha. Forte abraço.



5 comentários:


  1. Sandra Mallmann da Rosa Adorei, Ildo Meyer, assino embaixo. Amizade não se pede, se constrói na convivência. Os meios virtuais nos ajudam a ter alguma notícia de alguém distante não só no espaço, como também no tempo (como colegas de escola...), saber por onde anda, o que está fazendo. Mas nada substitui o contato real. Pena que as gerações que estão chegando estejam tão dependentes dos seus celulares, tablets e assemelhados e esqueçam (ou desaprenderam) de levantar a cabeça e olhar olho-no-olho por mais que alguns minutos e estreitar os laços.

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  2. Maria Euridice Correa Marota Escolho meus amigos não pela pele ou outro arquétipo qualquer, mas pela pupila. Tem que ter brilho questionador e tonalidade inquietante.
    A mim não interessam os bons de espírito nem os maus de hábitos. Fico com aqueles que fazem de mim louco e santo. Deles não quero resposta, quero meu avesso. Que me tragam dúvidas e angústias e agüentem o que há de pior em mim.
    Para isso, só sendo louco! Quero os santos, para que não duvidem das diferenças e peçam perdão pelas injustiças.
    Escolho meus amigos pela alma lavada e pela cara exposta. Não quero só o ombro e o colo, quero também sua maior alegria. Amigo que não ri junto, não sabe sofrer junto. Meus amigos são todos assim: metade bobeira, metade seriedade. Não quero risos previsíveis, nem choros piedosos.
    Quero amigos sérios, daqueles que fazem da realidade sua fonte de aprendizagem, mas lutam para que a fantasia não desapareça. Não quero amigos adultos nem chatos. Quero-os metade infância e outra metade velhice! Crianças, para que não esqueçam o valor do vento no rosto; e velhos, para que nunca tenham pressa. Tenho amigos para saber quem eu sou. Pois ao vê-los loucos e santos, bobos e sérios, crianças e velhos, nunca me esquecerei de que a “normalidade” é uma ilusão imbecil e estéril.
    Gosto mto deste texto!

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  3. Maria Cristina Molina Adorei! Saudade, amigo!

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  4. Ildo Kliemann Valeu, Xará. Gostei do seu site, bem organizado, e gostei do vídeo "sala de espera". Abraços.

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  5. Carmen Polvora Acompanho tuas palestras, dentro do possível Ildo , sempre soubemos da tua capacidade , parabéns !

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